Talvez um dos aspectos mais interessantes da direção desse filme seja a forma como o diretor sempre mantém o protagonista à uma distância considerável do foco da câmera. Não existem grandes closes, o que nos causa um distanciamento do personagem que é coerente com a psiquê dele, que por ser introvertido não permite a estranhos o privilégio de tão efusiva aproximação.
Talvez o melhor exemplo disso possa ser visto na cena
do primeiro beijo entre Charlie e Mary Elizabeth. A câmera, ao invés de se aproximar denotando intimidade, se afasta para ilustrar o distanciamento do próprio personagem em relação ao ato.
É bastante curiosa essa relação entre o protagonista e a câmera. Por ela sempre documentá-lo através de um ângulo muito aberto, sempre temos em vista o background da cena e acabamos subconscientemente considerando Charlie parte do plano de fundo -- wallflower, invisível --, sendo apenas mais um item compondo a mise-en-scene. E como isso não é uma prática cinematográfica muito comum, esse distanciamento contribui para a aura de estranheza que adorna o personagem. E não digo estranheza apenas conotando 'esquisitice', mas refiro-me também ao fato dele se sentir estranho -- alienígena, alheio -- ao mundo que o cerca.
E Truffaut estava certo -- mas como não haveria de estar -- ao sugerir que não existem filmes verdadeiramente anti-guerra.
Mesmo com toda a violência e desespero, Paths of Glory com suas tomadas abertas exibe vivacidade e transpira euforia, pondo-nos num contexto psicológico onde -- para todos os efeitos -- estamos presenciando a guerra em primeira mão, numa abordagem que o próprio Kubrick aperfeiçoou décadas depois ao abordar a guerra do Vietnã em Full Metal Jacket.
Paths of Glory não é um filme anti-guerra já que, nos termos propostos por Truffaut, isso é algo que nenhum filme jamais poderá ser. Paths of Glory, portanto, é um documento sobre a desumanização do homem; que tanto a nível pessoal quanto na esfera burocrática das corporações justifica banhos de sangue sob o pretexto de pensamento racional e da impassibilidade, quando as motivações são sempre puramente egoístas.
Dessa forma, surpreendeu-me a mensagem final da obra, já que Kubrick não optou pelo caminho fácil de atribuir a culpa pelas mazelas do mundo às grandes corporações e governos mas, de forma totalmente oposta, mostra que reside dentro de cada ser humano a capacidade de transformar o mundo. Seja para o bem ou para o mal.
Gosto de pensar que Segurança Nacional é um meta-comentário sobre o quão infrutífero é para o cinema brasileiro tentar emular o modelo de ação dos blockbusters americanos. Em meus devaneios, imagino Segurança Nacional como sendo um grito -- voluntariamente cartunesco -- por identidade, afim de nos mostrar através do contra-exemplo como diferentes culturas exigem diferentes linguagens cinematográficas. O roteiro -- escrito, rapidinho, num guardanapo durante uma roda de boteco e levado ao produtor pelo garçom que o repousou sobre um pires tão raso quanto a profundidade do seu argumento -- nos é entregue por atuações comicamente desajeitadas que fizeram com que eu me perguntasse se tudo aquilo não era uma crítica às expressões anacrônicas e dissonâncias linguísticas da dublagem brasileira.
"On his deathbed, Morris Zelig tells his son that life is a meaningless nightmare of suffering"
que me apaixono cada vez mais pela obra de Woody Allen.
Cada um de seus filmes é um parágrafo da autobiografia que ele vem escrevendo ao longo de seus quase cinquenta anos de carreira. E com um acervo tão autoral e passional, não é surpresa de que cause uma assimilação irresistível com uma considerável parcela de sua audiência. E é uma sensação reconfortante ouvir num filme do Woody a frase que citei acima e ter aquela sensação de "é exatamente assim que eu me sinto"... pois eu sei que, nalgum ponto da vida de Woody Allen, ele se sentiu dessa mesma forma.
Após subir os créditos fiquei estático no sofá, olhando para a televisão tentando digerir o que eu tinha acabado de presenciar. Triste, estarrecedor, marcante e inesquecível.
Assistam Dear Zachary.
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As Vantagens de Ser Invisível
4.2 6,9K Assista AgoraTalvez um dos aspectos mais interessantes da direção desse filme seja a forma como o diretor sempre mantém o protagonista à uma distância considerável do foco da câmera. Não existem grandes closes, o que nos causa um distanciamento do personagem que é coerente com a psiquê dele, que por ser introvertido não permite a estranhos o privilégio de tão efusiva aproximação.
Talvez o melhor exemplo disso possa ser visto na cena
do primeiro beijo entre Charlie e Mary Elizabeth. A câmera, ao invés de se aproximar denotando intimidade, se afasta para ilustrar o distanciamento do próprio personagem em relação ao ato.
É bastante curiosa essa relação entre o protagonista e a câmera. Por ela sempre documentá-lo através de um ângulo muito aberto, sempre temos em vista o background da cena e acabamos subconscientemente considerando Charlie parte do plano de fundo -- wallflower, invisível --, sendo apenas mais um item compondo a mise-en-scene. E como isso não é uma prática cinematográfica muito comum, esse distanciamento contribui para a aura de estranheza que adorna o personagem. E não digo estranheza apenas conotando 'esquisitice', mas refiro-me também ao fato dele se sentir estranho -- alienígena, alheio -- ao mundo que o cerca.
Glória Feita de Sangue
4.4 448 Assista AgoraE Truffaut estava certo -- mas como não haveria de estar -- ao sugerir que não existem filmes verdadeiramente anti-guerra.
Mesmo com toda a violência e desespero, Paths of Glory com suas tomadas abertas exibe vivacidade e transpira euforia, pondo-nos num contexto psicológico onde -- para todos os efeitos -- estamos presenciando a guerra em primeira mão, numa abordagem que o próprio Kubrick aperfeiçoou décadas depois ao abordar a guerra do Vietnã em Full Metal Jacket.
Paths of Glory não é um filme anti-guerra já que, nos termos propostos por Truffaut, isso é algo que nenhum filme jamais poderá ser. Paths of Glory, portanto, é um documento sobre a desumanização do homem; que tanto a nível pessoal quanto na esfera burocrática das corporações justifica banhos de sangue sob o pretexto de pensamento racional e da impassibilidade, quando as motivações são sempre puramente egoístas.
Dessa forma, surpreendeu-me a mensagem final da obra, já que Kubrick não optou pelo caminho fácil de atribuir a culpa pelas mazelas do mundo às grandes corporações e governos mas, de forma totalmente oposta, mostra que reside dentro de cada ser humano a capacidade de transformar o mundo. Seja para o bem ou para o mal.
Segurança Nacional
1.7 218Gosto de pensar que Segurança Nacional é um meta-comentário sobre o quão infrutífero é para o cinema brasileiro tentar emular o modelo de ação dos blockbusters americanos. Em meus devaneios, imagino Segurança Nacional como sendo um grito -- voluntariamente cartunesco -- por identidade, afim de nos mostrar através do contra-exemplo como diferentes culturas exigem diferentes linguagens cinematográficas. O roteiro -- escrito, rapidinho, num guardanapo durante uma roda de boteco e levado ao produtor pelo garçom que o repousou sobre um pires tão raso quanto a profundidade do seu argumento -- nos é entregue por atuações comicamente desajeitadas que fizeram com que eu me perguntasse se tudo aquilo não era uma crítica às expressões anacrônicas e dissonâncias linguísticas da dublagem brasileira.
Mas, não. Não era nada disso.
Segurança Nacional é apenas um filme muito ruim.
Zelig
4.2 355É por passagens como
"On his deathbed, Morris Zelig tells his son that life is a meaningless nightmare of suffering"
Cada um de seus filmes é um parágrafo da autobiografia que ele vem escrevendo ao longo de seus quase cinquenta anos de carreira. E com um acervo tão autoral e passional, não é surpresa de que cause uma assimilação irresistível com uma considerável parcela de sua audiência. E é uma sensação reconfortante ouvir num filme do Woody a frase que citei acima e ter aquela sensação de "é exatamente assim que eu me sinto"... pois eu sei que, nalgum ponto da vida de Woody Allen, ele se sentiu dessa mesma forma.
Dear Zachary: Um Caso Chocante
4.4 251Após subir os créditos fiquei estático no sofá, olhando para a televisão tentando digerir o que eu tinha acabado de presenciar. Triste, estarrecedor, marcante e inesquecível.
Assistam Dear Zachary.